“Mentir para si mesmo é sempre a pior mentira.” (Renato Russo)
Todos mentimos, por variadas razões, às vezes mais, outras vezes menos.
Mentimos no trabalho, no bar, na entrevista de emprego, para os amigos,
para os filhos, para os pais, para quem quer que seja. E assim vamos
enganando a todos, menos a nós mesmos, porque a nossa verdade estará
sempre aqui dentro de nós, lembrando-nos de que aquilo que vivemos é
consequência direta do que estamos ou não fazendo de nossas vidas.
Às vezes, mentimos aos colegas de trabalho sobre nossas reais
potencialidades, omitindo o quão desgostosos estamos com aquela rotina
de serviços que não têm nada a ver com o que pretendíamos ser. Engolimos
nossa frustração, desviamos nossos olhares, fugimos ao enfrentamento do
que poderia – e deveria – ser mudado, por medo e insegurança, pois
temos a mania de nos sentirmos bem mais incapazes do que na verdade
somos.
Outras vezes, mentimos no círculo de amigos, mostrando-nos simpáticos
com todos, como se gostássemos de cada um deles, assim como são.
Fingimos não ouvir os comentários descabidos, não ligar para as
gracinhas desagradáveis, atuamos dolorosamente para não dizer o quanto
aquela pessoa é chata, pois não queremos que ninguém pare de gostar de
nós, iludindo-nos com a ideia equivocada de que somos amados por todos.
Não raro, mentimos aos familiares, sorrindo sempre, o tempo todo, como
se vivêssemos uma vida perfeita, como se nossos filhos não dessem
problemas, como se a lua de mel fosse eterna, todas as noites, no quarto
de casal. Estranhamente, não nos sentimos no direito de dividir as
tristezas com quem cresceu no mesmo lar, não queremos incomodar, não
queremos expor os fracassos com que somos devastados continuamente.
Muitas vezes, mentimos ao parceiro, fingindo que está tudo bem, que nada
mudou desde que nos conhecemos, como se não tivéssemos sido expostos às
fraquezas e ao pior de cada um, como se não tivéssemos nos ofendido com
palavras agressivamente cruéis, como se não vivêssemos culpando um ao
outro pela grana curta, pelo filho rebelde, pelo tédio que se instala
nas noites de sábado, pelo silêncio ensurdecedor que tira o nosso sono.
O pior de tudo é aquilo que não sai de nós, aquilo que se acumula na
forma de ressentimento e impotência, tudo aquilo que não fizemos, não
dissemos, não fomos ou deixamos de ser. Tentamos inutilmente nos iludir
com as mentiras escapatórias que criamos, pois bem sabemos, no fundo, da
nossa imensa parcela de responsabilidade sobre o curso que tomam nossas
vidas.
Por mais que doa, por mais que resistamos, é preciso assumir as próprias
fraquezas, a falência dos sonhos, a tristeza, a decepção e o incômodo
que intranquiliza os nossos dias, conscientizando-nos de que depende tão
somente de nós mesmos a mudança de rumo, de postura, de pensamento que
será capaz de nos tirar de onde nos sentimos tão desconfortáveis.
Ou agimos contra tudo o que nos diminui, ou manteremos a mentira, a dor e
a infelicidade de uma vida vazia e totalmente deslocada do que
realmente queremos para nós. Porque viver sem sorrir é como morrer e
continuar respirando com sufoco, entre lágrimas, com um coração vazio e
sem amor, sem amar.